O fechamento da Ford e a desindustrialização do Brasil

O jornal O Poder Popular trouxe a economista Sofia Manzano, da UESB, em companhia do historiador Sidney Moura*, da Unidade Classista, e da mediadora Gercyane Mylena, para debater a industrialização do Brasil e o movimento que levou ao encerramento das atividades produtivas da Ford no país.

No imaginário brasileiro popular do século passado, o automóvel foi o símbolo da inovação e da indústria.

A base rural da economia brasileira de cem anos atrás limitava o gasto das rendas de exportação de produtos agrícolas à importação de bens manufaturados por quem auferia a riqueza. A necessidade, por um lado, de substituição de importações e a oportunidade, por outro de desenvolver o capitalismo e o mercado interno no Brasil levaram, a partir da Revolução de 30, a projeto de Estado para incentivar a industrialização.

Manzano explicou que o plano era suportado por um tripé: o Estado encarregou-se dos investimentos nas indústrias de base; o capital externo trouxe suas fábricas para o Brasil, com participação subsidiária de alguns capitais nacionais; e a incipiente burguesia brasileira procurou ocupar algumas brechas no processo produtivo, tornando-se fornecedora das empresas multinacionais.

O Romi-Isetta

Grandes montadoras de automóveis – Ford, GM e Volkswagen – ampliaram sua presença no Brasil nas décadas seguintes (a Fiat veio nos anos 70), aproveitando a farta energia e o aço brasileiro e, acima de tudo, a mão de obra mais barata. No setor automotivo, 95% da produção chegou a ser consumida em solo pátrio – ainda hoje são 85% as vendas internas.

Não só na montagem dos automóveis, o modelo contou com forte subsídio estatal e câmbio favorável aos interesses, mas não seguiu o rumo da Coreia do Sul e da Índia, cujos processos de industrialização tornaram os países autossuficientes no domínio tecnológico da indústria.

Nos anos 1990, com a colaboração do outrora combativo e poderoso sindicalismo metalúrgico, veio o novo regime automotivo. Novas montadoras aportaram no Brasil de então, mas a burguesia enriquecida não suportou o apelo da redução do índice de nacionalização dos automotores, vendeu suas fábricas às multinacionais e foi se bastar no mercado financeiro.

O programa InovaAuto de 2012, voltado à inovação tecnológica da indústria, nada mais fez que transferir recursos públicos ao setor. Sobre base de investimentos, naquele ano, de R$ 4,6 bilhões de recursos próprios, dois anos depois somente R$ 3,4 bilhões foram aplicados, já baseados em subsídios públicos.

A Ford saiu do Brasil devendo R$ 355 bilhões ao BNDES. Saiu? Não, vai manter seu escritório de projetos por aqui, para aproveitar incentivos fiscais, e trazer carros dos países vizinhos também se beneficiando dos acordos do Mercosul.

Sob o regime liberal brasileiro, em a burguesia não cumprindo o papel que o interesse nacional a ela destinava, o comando veio de fora.

Saem as indústria “velhas”, as novas não vêm, concluiu Sofia. O Brasil fica assim para trás em relação à China, Índia e Coreia.

*Abordaremos as considerações de Sidney Moura em breve.

Publicado por Iso Sendacz

Engenheiro Mecânico pela EESC-USP, Especialista aposentado do Banco Central, conselheiro da Casa do Povo, EngD, CNTU e Aguaviva, membro da direção estadual paulista do Partido Comunista do Brasil. Foi presidente regional e diretor nacional do Sinal. Nascido no Bom Retiro, São Paulo, mora em Santos.

4 comentários em “O fechamento da Ford e a desindustrialização do Brasil

  1. Olhada geral muito boa! Faltam no entanto elementos! A carga de impostos sobre os veiculos ( da ordem de 70%) e sobre os salarios de uma maneira geral, reduz ou anula a competitividade. O Estado mata a galinha dos ovos de ouro! A ganancia estatal sufoca o que poderia ter sido excelente alavanca para o progresso!

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