
Ricardo Plaza, 2.5.2021
O professor Ricardo Plaza procura estabelecer parâmetros objetivos e subjetivos para isolar e derrotar a política negacionista do governo federal, desnudando a essência reacionária do bolsonarismo por trás da aparência popular que o presidente ostenta.
Entendemos que há, naquilo que chamamos de direita e esquerda, setores conservadores que buscam “equilibrar o jogo” segundo os interesses de classe envolvidos nas relações capitalistas preponderantes entre nós. Sendo primordialmente defensores da vida e da democracia, têm ponto de unidade aos setores mais progressistas em um projeto nacional que recoloque o Brasil sob os interesses dos brasileiros.
As divergências do como podem ser discutidas depois. Vamos ao professor:
Este artigo tem como objetivo explicar porque o bolsonarismo e a extrema direita NÃO são tão fortes assim quanto parecem ser atualmente nas ruas e na internet, apesar de o Bolsonaro continuar razoavelmente forte e com o apoio de cerca de um terço (30%) da população.
O coração (base social/núcleo/foco) do apoio ao bolsonarismo e da extrema direita está situado da classe média para cima na pirâmide social… ou seja, está sobretudo nas classes A e B e em parcelas consideráveis das classes C/médias situadas no campo conservador.
Já o coração (base social/núcleo/foco) do apoio às políticas públicas de esquerda e ao campo progressista (e de uma candidatura que lidere a oposição a Bolsonaro em 2022) está concentrado das classes médias para baixo ou seja, sobretudo nas classes E e D e em parcelas das classes médias/C, sempre falando de MODO GERAL.
Isso é natural porque as esquerdas existem para diminuir as desigualdades sociais, combater a situação de extrema opressão dos mais pobres e lutar contra a exploração mais selvagem do capitalismo e do neoliberalismo sobre a população mais desamparada que está situada na base da pirâmide social.
As direitas existem para manter o status quo no âmbito do sistema capitalista e os valores mais arraigados do capitalismo, sobretudo aqueles associados à necessidade de acumulação incessante do capital … portanto, aqui no Brasil e no mundo todo, as elites (banqueiros, financistas, ruralistas, industriais, grandes comerciantes, setores com salários muito alto do serviço público como juízes e procuradores, militares de alta patente etc.) sempre tendem a ver com simpatia a extrema direita… foi assim na Alemanha nazista, com Mussolini na Itália e com Trump nos Estados Unidos e é assim obviamente com Bolsonaro no Brasil.
Obviamente há pessoas das classes A e B progressistas e de esquerda – muitas vezes por um sentimento de empatia ou por humanidade ou por consciência de que uma sociedade menos desigual é algo bom no longo prazo para todos, inclusive para a própria elite -, bem como há pessoas das classes D e E reacionárias e bolsonaristas, o que é um paradoxo, porque são pessoas brutalmente prejudicadas pela esmagadora maioria das decisões tomadas pelo governo Bolsonaro, mas estão convencidas que estão sendo beneficiadas.
Eu estou aqui obviamente remetendo a tendências estatísticas GERAIS e a comportamentos mais típicos encontrados em diferentes classes sociais, mas sempre haverá exceções a essas tendências: não existe um determinismo na análise de comportamentos de classes e de frações de classe.
As elites próximas do topo da pirâmide social ganham muito, sobretudo no curto prazo, com o bolsonarismo, com o empobrecimento de muitos brasileiros das classes populares (e os milhões de desempregados). Parte da classe média mais reacionária tem a ilusão (meio sádica) que está ascendendo socialmente quando vê os de baixo decaindo brutalmente em suas condições de sobrevivência: é um comportamento totalmente destituído de qualquer sentimento de empatia pelos setores sociais que estão se empobrecendo.
Assim, a esquerda existe sobretudo para procurar melhorar as condições de vida das classes populares com políticas, por exemplo, para ampliar e fortalecer os serviços públicos, melhorar e valorizar a educação pública, reforçar o SUS, aumentar o financiamento à ciência e à cultura, reforçar programas sociais de combate à miséria, equilibrar o embate entre capital e trabalho do lado do mais fraco ou seja dos trabalhadores, valorizar o salário mínimo, aproximar o Brasil de outras nações do terceiro mundo que estão nas mesmas condições que nosso país, criar políticas de inclusão social, criar políticas públicas de combate a preconceitos seculares como racismo, machismo e homofobia , defender a legislação trabalhista, defender políticas de proteção ambiental contra a exploração predadora dos recursos naturais, ressaltar a importância dos sindicatos de trabalhadores e regular setores capitalistas, a exemplo do capitalismo financeiro, restringindo o que eles podem ou não fazer.
A direita existe para manter a situação existente e a estrutura extremamente desigual de nosso capitalismo selvagem. Por essência a direita quer manter a situação social e as coisas do jeito que elas estão ou se for possível quer intensificar o grau de exploração do capitalismo pela destruição de leis e políticas públicas que se opõem ao desejo de acumulação insaciável do capital por mais lucro.
RESUMINDO
Para as pessoas de extrema-direita, qualquer política pública de combate às desigualdades sociais e ao capitalismo selvagem significa para eles COMUNISMO.
Vale a pergunta: Quem de nós nunca foi chamado por um bolsonarista de comunista pelo simples fato de estar tendo uma posição humanitária ou de ter empatia com pessoas em situação de exploração absoluta ou até mesmo de estar defendendo a ciência?
Então, em suma, de modo GERAL a base social do bolsonarismo está na metade mais privilegiada economicamente da sociedade, enquanto, de modo GERAL, a base social de apoio a políticos e partidos progressistas está na metade mais economicamente desprivilegiada da sociedade.
Logo, de modo GERAL, bolsonaristas têm geralmente mais recursos financeiros, mais tempo livre e menos preocupação com as suas próprias condições de sobrevivência do que as pessoas da base social de oposição ao Bolsonaro. Eles têm um acesso muito maior a internet e à militância digital (mais tempo livre e mais recursos monetários para adquirir equipamentos computacionais / eletrônicos, energia elétrica e acesso à internet) que a base social antibolsonarista.
Por consequência, em pesquisas pela internet, quase sempre propostas que contam com o apoio do bolsonarismo vão inevitavelmente vencer.
Mas a internet não representa a sociedade de forma proporcional.
Boa parte da base social de oposição ao bolsonarismo não está na internet e, se está, não tem tempo livre ou recursos financeiros, nem experiência de militância, para a luta política no ambiente digital e virtual…
A internet NÃO é um reflexo da sociedade: os ambientes virtuais contam com uma presença muito mais acentuada de pessoas situadas na metade de cima da pirâmide social…
Adicionalmente a este argumento relacionado aos interesses e antagonismos das classes sociais, como o núcleo duro do negacionismo da ciência está localizado na extrema direita (no mundo todo), os bolsonaristas têm muito maior tendência a participar de manifestações de rua, com as inevitáveis aglomerações, do que as pessoas de esquerda que em média são muito menos negacionistas da ciência e costumam seguir com muito maior intensidade as recomendações de saúde pública.
Então, o bolsonarismo junta mais condições materiais, mais tempo livre, menos preocupação com as condições materiais de sobrevivência em termos sociais e menos receios científicos para incentivar os seus apoiadores a participarem de manifestações de rua cheias de aglomerações defendendo propostas golpistas típicas da extrema-direita.
Concluindo, o fato de o bolsonarismo aparentar ter, na internet e em manifestações de rua, uma força maior do que tem de fato, está relacionado às características das bases sociais, no que diz respeito à estrutura de classes, de apoio ao bolsonarismo e de oposição ao bolsonarismo, bem como ao negacionismo da ciência prevalecente na extrema-direita.
É IMPORTANTE RESSALTAR
Essa aparente força desproporcionalmente maior do bolsonarismo NÃO DEVE desanimar aqueles que se opõem ao governo protofascista, genocida e negacionista da ciência que temos, pois é a ESPERANÇA que nos dá ânimo para lutar por dias melhores. Sem esperança não há por que lutar.
É importante ser realista e reconhecer que o bolsonarismo ainda é forte, mas mais importante ainda é ser otimista e avivar as esperanças daqueles que lutam por uma sociedade menos injusta: o Bolsonaro não é invencível e com inteligência, união e estratégia a candidatura à reeleição do Bolsonaro pode ser derrotada na eleição de 2022.
Finalizando, estou obviamente sempre procurando refletir sobre estratégias, mas neste momento, no início de maio de 2021, estou totalmente convencido que Lula é o candidato mais viável para derrotar Bolsonaro em 2022.
A opinião final de Plaza sobre a viabilidade de candidaturas à superação do atual governo não corresponde à nossa, mas é igualmente válida na conformação da ampla frente em defesa da vida, da democracia e do Brasil.
Ricardo Plaza é docente doutor no Instituto Federal de São Paulo, Campus Caraguatatuba, e aqui já reportamos as partes primeira e segunda do seminário Holocausto, nazismo e negacionismo, por ele organizado no final de 2020.