
No artigo introdutório, procuramos demonstrar que o dinheiro, a par de equivalente universal das mercadorias, é ele próprio objeto de intermediação mercantil.
Nessa condição, o preço do dinheiro – a taxa de juros – deveria ser regulado pela famosa lei da oferta da procura do capitalismo. Assim, quanto menos dinheiro disponível, mais caro ele é. Do contrário, em situações de alta liquidez, o preço deveria baixar.
Antes de tratarmos dos porquês, um exemplo de como não acontece essa regulação espontânea:
O Banco Central do Brasil, no seu direito e dever de regular as relações financeiras em território nacional, rebaixou o teto de juros dos empréstimos consignados de 3% a 1,8% mensais, como forma de auxiliar no enfrentamento à pandemia. As instituições financeiras cujo funcionamento autorizou prontamente adotaram o novo patamar máximo. No período imediatamente anterior, no entanto, era possível conseguir o dinheiro no mercado a 1,4% ao mês.

Isso acontece porque há mais de um século não vigora o livre mercado nas relações capitalistas. A incessante busca de recomposição das margens de lucro pelo capital leva à concentração nas mãos de cada vez menos proprietários o dinheiro disponível. O processo dá-se tanto pela aquisição como pela destruição dos concorrentes, substituindo a livre-iniciativa que funda a nossa República por monopólios que hoje transcendem um ramo específico da economia.
Se é verdade para a indústria de armas e de medicamentos, mais ainda o é na compra e venda de dinheiro que, como classificava Hilferding, encima a cadeia de poder nas relações econômicas – é o capital financeiro.

Se a economia se retrai, há menos gente buscando dinheiro para novos negócios, e o preço da mercadoria sobe.
É simples a razão: o retorno do capital a margens pelo menos semelhantes ao período de expansão precisa ser obtido de um número menor de unidades do produto. Tal prática é possível quando há monopólio sobre o mercado.
Se há isolamento social para salvar vidas e as pessoas não estão comprando eletrodomésticos e joias neste período, a extração de lucro sobre o dinheiro é transferida para outros negócios. O consignado, por exemplo, como visto acima.
Quando a ganância não pode ser contida pela consciência dos proprietários do capital, que seguem nas ruas em suas carreatas da morte, o Estado precisa tomar suas providências. Conter a exploração dos governados da mesma forma que o vírus.
Sugerimos a leitura da entrevista de Sergio Rebelo à BBC sobre o risco de permanência da recessão mesmo em caso de fim do isolamento social.