
O General Nelson Werneck Sodré foi, além de servir ao Brasil na instituição castrense, economista, historiador e escritor sobre as coisas do nosso país. Ligado ao ISEB no final dos anos 1950, sua profícua obra pela afirmação da cultura e o desenvolvimento nacional mereceu dois destaques no Pensamento Nacional-desenvolvimentista. Aqui tratamos do Capítulo 8, correspondente à aula inaugural da turma de ingressantes isebianos de 1959.
Para demonstrar que o nacionalismo possuía então raízes profundas no ser nacional – como hoje persiste o elo -, Werneck explica que há momentos de caducidade das velhas relações em convivência com a gestão de novas formas sociais e econômicas que, com o tempo, tornam-se hegemônicas para, no futuro, configurar-se como coisa a ser substituída.
O historiador classifica em três as fases características de transformação institucional: a da Independência, a da República e a da Revolução Brasileira. Sobre a primeira, ele pondera:
Assim como a descoberta e o povoamento foram consequência da Revolução Comercial, a Independência está vinculada à Revolução Industrial. É a Revolução Industrial que exige a ruptura do regime de monopólio de comércio, que era a própria razão de ser da dependência, naquela fase, em relação à metrópole.
No início do século 19 os proprietários de terra e de escravos no Brasil objetivamente interessaram-se em romper o monopólio comercial de Portugal para exportar sua produção diretamente em troca com os novos centros de produção industrial, capitaneados pela Inglaterra. No entanto, seguia lhes servindo o trabalho escravo, ainda que o tráfego negreiro sofresse forte constrição, por pressão externa.
Tanto os capitais envolvidos no comércio de gente como os homens livres não-proprietários foram formando uma classe média que se dedicava aos serviços públicos e privados, acumulando condições para por fim ao Império – e à escravidão inibidora da constituição do mercado interno, estabelecendo sob o marco da República relações capitalistas dependentes dos centros imperialistas.
Na virada do século 20, alguma indústria de manufatura começava a surgir no Brasil e, com ela, fortalecia-se a burguesia nacional e nascia uma classe operária brasileira. A perda de mercado do açúcar nordestino e a queda das exportações de café levaram o Brasil a um endividamento que só fez reforçar a dependência externa.
Surgia a oportunidade de o Brasil romper os laços servis com os centros imperiais, baseado também no capital mineiro que surgia, dando passo à Revolução nacionalista de 1930, para sanar a velha regra concentrar os lucros e socializar os prejuízos, vez que as condições de o nascente capital nacional enfrentar o capital estrangeiro, presente nas modalidades de subsidiárias e empréstimos, eram bastante adversas.
Nessas três décadas intermeadas pela segunda guerra mundial, o que era o velho e o que era o novo?
É velha a orientação de relegar o Estado à inércia; é velho o mercantilismo que se traduz numa curva ascensional em volume e decrescente em valor; é velha uma norma que nos aprisiona nos moldes de fazenda tropical produtora de matéria-prima para industrialização externa; é velho o que nos subordina a razões externas, por legítimas que sejam no exterior; é velha, particularmente, a ideia de que o Brasil só se pode desenvolver com ajuda alheia e, principalmente, com capitais estrangeiros.
Nova é a composição social que inclui uma burguesia capaz de compreender a sua oportunidade, a classe média atenta e ideologicamente receptiva e uma classe trabalhadora
que adquiriu consciência política e se mobiliza, a fim de partilhar
do empreendimento nacional, vendo nele a abertura de perspectivas ao seu papel histórico. Novo é, pois, o povo.Nova é a indústria nacional, superada a etapa de bens de consumo e iniciada a de bens de produção, limitada embora pelo atraso na capacidade aquisitiva do mercado interno e onerada por uma política de obstáculos e de dúvidas. Volta Redonda é o novo que afirma a nossa capacidade de realização sem interferências.
Um comentário em “Nelson Werneck e as raízes históricas do nacionalismo brasileiro”