Nem todas as lições do que chamamos de universidade são, nem poderiam ser, ensinadas entre as quatro paredes de uma sala de aula ou laboratório. Para além da Engenharia Mecânica em que me graduei na USP, em São Carlos, alguns episódios deixaram lições que merecem registro.

A portaria que guarnece o campus nestes anos ainda democráticos talvez tivesse outra finalidade se instalada nos estertores da ditadura. Sim, a Escola funcionava em um praça em que alunos, professores, funcionários e cidadãos podiam ingressar livremente.
E sair. Nós paulistanos que prestamos vestibular para início em 1978 nos lembrávamos das manifestações estudantis do ano anterior, duramente reprimidas pela polícia. O justo temor explicado pelos veteranos era de que nos trancafiassem dentro por qualquer ato de Justiça que fosse clamado. Uma greve de um semestre manteve abertas as portas aos cidadãos, uma instrutiva vitória para quem chegava, como eu, aos dezoito anos de idade.
1979 foi o ano da reconstrução da UNE, que contou com grande participação dos estudantes carlopolitanos. No ano seguinte, tivemos a honra e a responsabilidade de representar os colegas de curso no 32º Congresso, realizado em Piracicaba, São Paulo.
Sobre a vanguarda estudantil na luta por uma nova Constituição da República Federativa do Brasil já havíamos nos referido em Toda a Verdade em 8 Páginas.
A foto ao lado foi descoberta pelo meu filho, para um trabalho escolar de o que faziam os pais quando jovens. Na primeira fila dos organizadores, logo atrás da direção da UNE, está a estudante da Unimep Edna Maria Rossetto, Sendacz desde 84.


A defesa consequente da gratuidade e universalidade do ensino universitário também foi matéria de aula extra-classe.

A qualidade e o custo da alimentação dos estudantes foi objeto de extensa luta e concorridas assembleias dos futuros engenheiros, matemáticos, químicos e físicos. Uma coleta junto aos professores e funcionários permitiu custear a ida de uma delegação à Reitoria da USP, em São Paulo, onde acampamos até que fosse limitado a uma unidade monetária o preço do nosso almoço. A volta foi outra conquista: passagens de trem que então ligavam o Estado de São Paulo.
Grata a verificação, quando retornamos ao campus, de o bandejão ter preço fixado em R$ 1, mais de trinta anos depois.
Os transportes urbanos também foram motivo de movimento que tomou conta da cidade. Ante a majoração injustificada da tarifa, primeiro os estudantes, depois os trabalhadores e as donas de casa, pularam a roleta. Lembro de um grupo de senhoras que perguntavam como proceder, dada a menor mobilidade que a idade traz a todos – não, não era gratuito na melhor idade. Elas giravam meia catraca, passavam todas e pagavam ao cobrador uma passagem.
Tão truculenta como ridícula foi a resposta da máfia dos transportes: soldar uma catraca em cima da outra e gradear sobre o banco em frente. Do que me lembro, desde então até que nos formamos, nem um centavo a mais foi cobrado dos são-carlenses por ir e vir.
Tem muito mais, mas concluamos com a visita do pouco querido então governador Paulo Maluf à cidade. Não foi à inauguração a que veio, saiu do hotel sob forte batida policial, com os estudantes de costas para o veículo entoando o Hino Nacional.
Esse movimento de pular a catraca, trouxemos de Belém, onde já haviamos feito movimento idêntico. Foi um movimento vitorioso capitaneado pela UMESC, hoje extinta.
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